Por Indiana Borralho 

Setembro é o mês de falarmos sobre prevenção ao suicídio, de acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS) estima-se que 800 mil pessoas morrem por suicídio todos os anos no mundo, e o Brasil tem cerca 1,5% de parcela nesse dado. Parece pouco, né!? Mas não, pois toda vida é importante, mas só para ficar claro, esse 1,5% equivale a 12 mil suicídios anualmente.

Reflexões acerca desse assunto é significante, pois pode mudar toda uma vida de maneira coletiva. Pensando nisso, vamos contar algo especial que aconteceu com uma profissional da saúde, a qual ressignificou se olhar quanto ao suicídio, por ser “salva” desses pensamentos através de uma “simples” ação.

A entrevista é com a Enfermeira Lidiana Laura Campos Borralho de Arruda, formada há 14 anos, especialista e mestre pela UFMT.

Você é uma profissional da linha de frente na pandemia, como está reagindo diante desse momento?

Não estou reagindo… ou não estava (risos), estou afastada das minhas atividades laborais para tratamento de uma doença que eu não aceitava dizer o nome e tão pouco tratar por inteiro. O que eu mesma dizia para que outras pessoas fizessem, eu não queria fazer. E o que eu não queria era justamente aliar a terapia medicamentosa, afastamento temporário do serviço e terapia com Psicólogo… ou seja, TRATAR!

O que te levou a afastar-se das suas atividades, foi o medo da pandemia?

Uma série de motivos, porém foi a conduta médica que dessa vez eu aceitei,…não eximindo uma parcela pelo medo da pandemia, afinal sou enfermeira, mãe, mulher, esposa, filha, irmã, amiga, dona de casa e ativista na amamentação materna e doação de leite humano… além de uma pessoa que trava uma batalha há 8 anos contra uma doença que ainda é muito subjugada pela sociedade, a DEPRESSÃO.

Entre idas e vindas do tratamento, passei por diversas áreas da medicina como ortopedia, cardiologia, endoscopia, endocrinologia, neurologia e por fim psiquiatria. Mudei de médicos, de áreas, de remédios, de métodos, de endereço e até de ideias… e assim aceitei o TRATAMENTO.

O tratamento te permite parar, respirar, focar e melhorar, certo!? Conte-nos o ponto alto dessa melhora.

Afastada e trabalhando meu retorno durante as sessões de terapia, uma pessoa muito querida veio até mim por mensagem e pediu minha ajuda para o Banco de Leite Humano de um Hospital Universitário, pois estavam com uma demanda de leite superior à sua capacidade e estavam por ficar sem ter um freezer para congelar os leites doados e os leites pasteurizados.

Para vocês entenderem melhor porque essa demanda veio até mim é que eu amo e confio muito no poder nutricional do leite materno, já fui doadora, amamentei meus dois filhos até os 02 anos e meio, apoio qualquer mãe que quiser amamentar ou doar e… sou funcionária do Banco de Leite Humano. E esteja onde eu estiver irei falar e apoiar este ato. Levanto a bandeira sem subjugar quem não queira, estou para informar, apoiar e jamais julgar.

Como vem sendo seu contato com a terapia com psicólogo? Você sentiu que vem ajudando? E a ideia de ajudar o outro e se ajudar concomitante, é uma forma que você encontrou sem perceber que tudo isso poderia fazer parte do seu tratamento. Sabemos que existe um ponto alto nessa história que fez seus olhos voltarem a brilhar, conte-nos melhor:

A terapia com toda certeza está me ajudando e eu ajudei e não pensei em me ajudar… na verdade isso foi consequência de ser ajudada (risos).

E assim com a oportunidade exata em mãos, seria exatamente o que eu precisava fazer, ser o que eu sempre fui, ajudando quem precisa foi um bom “link” para me ajudar, assim só pensei por um tempinho se eu conseguiria, se poderia dar certo, se eu teria ajuda, se seria possível, levantei valores, enfim… fiz algumas pesquisas.

A oportunidade para ajudar a gente sempre tem, mas nem sempre a gente sabe como começar ou por onde começar né?! E de fato conhecia a necessidade, que era de um freezer para o Banco de Leite Humano (BLH) do Hospital Universitário.

Essa ajuda ao BLH creio que tenha sido meramente simbólico, frente a tudo que venho enfrentando, quando você pensa que sua vida não vale mais nada e não que existe uma saída mágica ou um comprimido milagroso…

Quando você vem levando um passinho por vez e tem medo de voltar 10 grandes passos e eis que uma conversa com alguém que não precisava falar nada e não tinha obrigação nenhuma em continuar a luta, não desistiu e insistiu. Foi uma acadêmica de Medicina que sempre me apoia quando falo das demandas do BLH, a Camila, que uma breve pesquisa pelo Google vi o significado do seu nome: “Indica uma pessoa que é competente porque executa suas tarefas com amor”! Pronto.

Esse percurso de encontrar o caminho certo para ajudar e ser ajudada foi inusitado e você em tratamento antidepressivo buscou de que forma executar o que estava em sua mente?

Busquei ajuda para ajudar. E assim minha família me apoiou em TUDO, meu psiquiatra, meu psicólogo e o Centro Acadêmico XIII de abril, através da aluna Camila Vieira Gomes que intermediou tudo, mesmo de longe. Fomos nos informando sobre cada valor que conseguíamos, somando e sonhando juntas… e tudo começou a se materializar.

E de repente me veio a frase da placa de formatura: “Nenhum de Nós é Melhor que Todos Nós”. Nunca pensei que a frase da minha placa de formatura faria tanto sentido como está fazendo neste momento.

E uma coisa muito importante para mim aconteceu quando não desisti de ajudar e não desistiram de mim. Recebi muitas mensagens positivas da minha ação, mensagens de pessoas que eu nem imagina que iriam me responder, pessoas que me ajudaram e nem imaginam como me ajudaram, pessoas que há muito tempo eu nem falava e entraram em contato comigo e parte dessas doações nem foi em dinheiro e sou grata por todas essas doações. Existiram coisas negativas, mas estas a gente recarrega com carga positiva, né?!?!

Você fez um compromisso pessoal e profissional de uma maneira holística. Isso te fez ou faz feliz?

Sinceramente, nem sei dizer o que mais me deixou feliz ou o que me deixa mais feliz… conseguir o Freezer ou receber tanto apoio de tanta gente, tudo isso superou minhas expectativas em uma quantidade imensurável. De uma boa ação, vieram tantas outras boas ações, e posso dizer o quão bom é ajudar e ser ajudada. Aceitar que a gente precisa de ajuda, que não somos seres unos e acreditar que ainda há esperança na humanidade fortalece meu desejo de estar bem e fazer o bem. Simples coisas do nosso cotidiano pode salvar uma vida, uma família e a humanidade.

Porque? O que tudo isso te fez refletir?

Por que se em alguma parte errei nem sei…sabe porquê???? Porque eu tentei, tentei, tentei e por fim… acertei. Acertei na parceria, nas tentativas, nas pesquisas, nos orçamentos, nas tentativas, nas compras… e se eu errasse, sabe o que isso importaria? Nada. Porque a vida não é um jogo de errar e acertar, é VIDA e deve ser vivida com todo amor, respeito, compaixão, humanidade e todos os sentimentos bons que vierem na nossa cabeça. Sejamos Luz independente da tarifa (ou da bandeira rsrsrsrs).

Hoje você trata, hoje você se sente bem, hoje você está buscando sempre viver um dia de cada vez. Qual a mensagem que você tem diante da pandemia, do setembro amarelo, o que você tem para dizer às pessoas?

Saber que alguns entraves na nossa vida existem é fato, mas a forma de como você vai lidar é que decide o final. Você pode esmorecer na primeira tentativa ou pode decidir tentar até conseguir e se fortalecer, porque talvez caímos para aprendermos a nos levantar. Devemos buscar apoio necessário, apoio especializado no assunto, público ou privado. Só não devemos nos calar e consentirmos com o que nos deixa aflitos, deixando os pensamentos nebulosos pairando sob nossas cabeças. Setembro é o mês de lembrarmos dos transtornos psicológicos, mas não é o único período de preocupação! Procure uma ajuda! Deixe-se ajudar!

O Hospital Universitário referido nessa entrevista é reconhecido por diversos tratamentos executados com qualidade pelos profissionais que lá existem, que fazem com amor e muita competência. Nossa entrevista relata que “sinto orgulho de fazer parte dessa grande família e quero voltar forte e acreditar que posso somar com toda essa equipe”.

No dia 14 de setembro de 2020, a entrega do freezer com um termômetro digital para controle da temperatura e 48 frascos de 350ml de vidro com tampa de plástico (novos), será realizada. Ou seja, uma ação foi feita, uma ação foi concretizada, uma ação individual que se tornou coletiva, mudou o rumo de uma vida, de várias histórias. Para BLH faz a diferença para a conservação do leite para muitos prematuros da Unidade de Tratamento Intensivo Neonatal (UTINeo) e garantem que suas mães consigam se reestabelecer e logo poderem também alimentarem seus bebês.

A enfermeira deixa claro que: “Fomos eu, Thayná e Rayssa para fazermos a entrega no banco de leite, mas não é essa a grandiosidade do momento, é que boas ações podem fazer a diferença em qualquer lugar e para qualquer um”.

Parabéns a todos os envolvidos nesse momento, as estudantes em medicina Camila Vieira, Thayna Afuso e Rayssa Felippe que prontamente encabeçaram um novo ritmo para essa história, assim como a enfermeira Lidiana Arruda que deu o ponta pé inicial. Belas histórias devem ser evidenciadas e celebradas, que essas histórias como essa possam ser “reproduzidas” por diferentes pessoas, em diferentes circunstância permanecendo apenas o desejo de ajudar ao próximo.

Indiana Borralho

Técnica em Alimentos pelo Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Mato Grosso (IFMT). Biomédica habilitada em Patologia Clínica (Análises Clínicas) pelo Centro Universitário Cândido Rondon (UNIRONDON). Pós-graduanda no curso de especialização em Libras e Educação Inclusiva (Lato sensu) pelo Instituto Federal de Educação Ciência e Tecnologia de Mato Grosso (IFMT), Capacitanda em Assistência do Ato Transfusional e Suas Responsabilidades Legais pela Hemovigilância do MT-Hemocentro e Mestranda no Programa de Ciências Aplicadas à Atenção Hospitalar do Hospital Universitário Júlio Müller na linha de pesquisa em Saúde no Espaço Hospitalar: Diagnóstico, Tratamento e Intervenção sendo a área de concentração: Doenças infecciosas e parasitárias pela Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT). 

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